O QUE É “FORTUNA”?

Comentários acerca do Imposto Sobre Grandes Fortunas e a dificuldade de se entender o que é fortuna.

por Giovana Marcondes Naya

O Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF), mencionado frequentemente no debate político-econômico, é um imposto previsto pela Constituição brasileira de 1988, porém ainda não implementado. Contudo, embora haja tal previsão constitucional, pouco se sabe sobre os efeitos econômicos da introdução deste tributo no país. Existem vários projetos de lei em discussão no Congresso Nacional sobre essa matéria, mas há dificuldade em estabelecer uma definição consensual do que constituiria uma grande fortuna e qual seria o valor de referência a ser adotado.

Por exemplo, alguns projetos de lei propõem que patrimônios a partir de 2,2 milhões de reais sejam considerados grandes fortunas (composição do patrimônio, ou seja, se o contribuinte possuir um único imóvel avaliado neste valor, já seria a ele aplicável) e, portanto, estejam sujeitos à incidência do imposto. Outro projeto de lei estabelece que apenas patrimônios acima de 10 bilhões de reais seriam considerados fortunas. Essa falta de consenso sobre o valor de referência dificulta ainda mais a definição precisa do imposto.

Além disso, a forma como o imposto seria implementado também varia entre os projetos de lei em discussão. A maioria deles propõe a implementação de um imposto, de acordo com a previsão constitucional. No entanto, há propostas que sugerem o uso do empréstimo compulsório como forma de tributação das grandes fortunas, com o objetivo de financiar políticas públicas relacionadas à pandemia.

A adoção do IGF passou a ser considerada um instrumento de política tributária para lidar com os efeitos fiscais e socioeconômicos da pandemia, buscando enfrentar o aumento dos gastos públicos e aprofundamento da desigualdade social em 2020.

Além de analisar as propostas em tramitação no Brasil, um estudo do Insper também examinou a experiência de outros países que tributam grandes fortunas. Identificaram-se duas formas principais de tributação: o imposto sobre a riqueza líquida e o imposto sobre ativos selecionados.

No primeiro caso, o imposto incide sobre a diferença entre os ativos e as dívidas de um indivíduo, ou seja, é calculado levando em consideração apenas a riqueza líquida. Colômbia, Espanha, Noruega e Suíça adotaram essa forma de tributação.

No segundo caso, o imposto é aplicado sobre determinados ativos do indivíduo, geralmente ativos financeiros e imobiliários. Nessa abordagem, não se tributa toda a riqueza do contribuinte, mas apenas ativos específicos equivalentes, por exemplo, ao IPVA e IPTU no Brasil. Itália, França, Bélgica e Holanda optaram por essa forma de tributação, com os holandeses aplicando-a em uma faixa do imposto de renda pessoa física.

O mesmo estudo do Insper concluiu que o tributo veio recuando historicamente entre os países majoritariamente ricos da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) e que ele arrecada relativamente pouco onde existe. Estudos mostraram também alguma capacidade do contribuinte de esquivar-se da tributação.

É importante ressaltar que a tributação da riqueza pode gerar incentivos negativos, como a possibilidade de fuga de capitais e desestímulo ao investimento no país, como aconteceu com a Argentina. Além disso, a arrecadação por meio desse imposto é geralmente baixa, com a maioria dos países apresentando percentuais inferiores a 1% do valor total arrecadado.

Em linha com McGrattan (2015), conclui-se que afirmações contundentes e propostas acerca desse imposto tendem a ser prematuras. Ademais, quaisquer sinalizações a favor ou contra um IGF necessariamente deveriam considerar os demais tributos incidentes sobre a renda e patrimônio no país e seus índices de progressividade. Diante dessas considerações, é necessário analisar não apenas a experiência internacional, mas também o sistema tributário do Brasil, antes de se decidir sobre a implementação do imposto sobre grandes fortunas. Seria pertinente considerar alternativas, como a criação de faixas adicionais de arrecadação para o imposto de renda, levando em conta rendimentos superiores aos já existentes na tabela atual, se for o caso.

 

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